'Vovó viajante' de Maringá roda o mundo dentro de um carro
A “vovó viajante”, que prefere não criar roteiros, se permite voltar aos destinos preferidos e descobrir as belezas que a estrada reserva, sem pressa. | Foto: Arquivo Pessoal

Aos 67 anos

'Vovó viajante' de Maringá roda o mundo dentro de um carro

Cidade por Brenda Caramaschi em 03/09/2025 - 09:42

Aos 67 anos, a viajante maringaense Roseli Jardim conheceu 13 estados brasileiros e rodou por outros três países nos últimos três anos - tudo isso a bordo de um carro pequeno, sozinha, contando apenas com a companhia dos bichos de estimação em parte do trajeto. Todas as viagens são bancadas apenas com a aposentadoria que recebe.

Roseli Jardim trabalhou no comércio por boa parte da vida, foi casada por 25 anos, criou dois filhos e viu os três netos crescerem. Depois de se separar, se mudou para um pequeno contêiner, uma quitinete, no terreno de um irmão, mas o sonho, de verdade, era fazer a vida caber na mala. [ouça o áudio acima]

Sem carro grande, sem motorhome, sem mesmo fazer uma grande economia para juntar uma reserva financeira, ela entrou no Chevrolet Onix 1.0 que dirigia acompanhada de um galo e uma cachorrinha de estimação e pegou estrada sem destino certo e sem data para voltar. [ouça o áudio acima]

Aos filhos, Roseli disse apenas que viajaria até Porto Seguro, na Bahia, mas não deu muitas explicações. A primeira parada foi em Brasília, de lá, seguiu para o Espírito Santo passando por Minas Gerais e, depois, começou a subir pelo litoral nordestino, chegando até o Maranhão. No banco de trás, em uma gaiola, seguia o galo que ela tinha em casa e havia comprado para “pegar escorpiões” e no banco do passageiro seguia Fada, a cachorrinha que chegou na vida de Roseli ainda filhote. Mas a primeira sensação, ao fechar a porta do carro sem rumo e sem volta certa, era uma só: medo. [ouça o áudio acima]

O percurso durou sete meses e, pela estrada e nas paradas, ela ia fazendo amizades. Roseli só voltou para Maringá porque o irmão, com quem ela dividia o terreno onde vivia na cidade, faleceu. A experiência de viver em um carro mostrou que, mesmo morando em uma quitinete, ela tinha muito mais coisas do que precisava. [ouça o áudio acima]

Roseli bolou um novo roteiro inicial, se desfez do que tinha, doando móveis para os filhos e deixou o galo de estimação na casa de um deles, que morava no sítio. O galinho acabou morrendo tempos depois, atacado por cães, mas a cadelinha Fada, já idosa, estava novamente no banco do passageiro quando, em fevereiro de 2024, a maringaense embarcou na nova aventura com um destino em mente: Ushuaia, uma cidade turística na Argentina que fica no arquipélago da Terra do Fogo, no extremo sul da América do Sul, conhecido como "fim do mundo". 

O sonho parecia distante, mas aos poucos, ela foi percorrendo o Sul do Brasil. Passou um tempo em Urubici (SC), ficou um período em Gramado (RS), passou por Uruguaiana, saindo das terras gaúchas e, em janeiro de 2025, entrou na Argentina. Ao chegar ao país vizinho, ela se apavorou. [ouça o áudio acima]

Roseli conheceu dois casais de catarinenses e um de baianos pelo caminho e todos seguiriam para Ushuaia. Decidiram ir juntos. [ouça o áudio acima]

Uma semana depois, a maringaense decidiu se separar do grupo, porque queria conhecer uma rota que não fazia parte do roteiro deles: a Carretera Austral, uma rota cênica famosa pelas paisagens deslumbrantes, incluindo montanhas, geleiras, lagos e florestas, e que é considerada uma das estradas mais bonitas do mundo. Normalmente, essa rota é feita a partir de Puerto Montt, no Chile, mas Roseli faria o trajeto em sentido inverso. Chegando no Chile, em um local sem muita estrutura, a cachorrinha de estimação de Roseli, que já tinha problemas cardíacos, teve uma crise. Sem veterinários por perto, com quase 12 anos, Fada não resistiu. [ouça o áudio acima]

Apesar da tristeza, a viajante decidiu seguir. Foi até o deserto do Atacama, porém cruzando o Chile, em um trajeto não convencional. [ouça o áudio acima]

Roseli conta que ouviu até de viajantes profissionais, como caminhoneiros, que eles não teriam a mesma coragem que ela tem, em desbravar as estradas sem roteiro definido e sem nenhuma companhia ao lado. Em todo esse tempo na estrada, com mais de 20 mil quilômetros rodados, o carro em que ela vive não deu um único problema mecânico. 

Do Chile, a viajante maringaense passou pela Cordilheira dos Andes e seguiu pela Ruta 40, na Argentina, até o Uruguai e voltou para o Brasil para poder comprar remédios de uso contínuo que, segundo ela, são caros demais nos países vizinhos. Aqui, vai aproveitar para fazer um check up médico para garantir que a saúde está em dia. Ela entrou pelo Chuí, no extremo sul do Brasil, passou um tempo em Pelotas (RS), seguiu para o litoral gaúcho e conversou conosco diretamente de um camping em Gramado, onde ela passou as últimas semanas. Depois dali, Roseli segue sem saber para onde vai. 

A intenção dela é trocar o Onix que a acompanhou até aqui, e que tem servido de casa no último ano e meio, por um carro mais espaçoso. Mas não é para carregar mais coisas, não, já que ela garante que, muito do que levou para a viagem, acabou nem usando. Para o carro se transformar em casa, o banco foi adaptado para virar uma cama e, embaixo dela há um nicho para guardar roupas, calçados, e os crochês, que ela faz pelo caminho. 

Entre os próximos destinos de sonhos a serem realizados está uma viagem à Portugal, de onde veio o pai de Roseli, e um tour pelo Peru, além de novas rotas pelo Brasil. 

Diferente de outros “nômades”, Roseli não quer ser influenciadora, nem divulgar fotos e vídeos das viagens nas redes em busca de curtidas e engajamento - os registros ficam para a família apenas, além de grupos que reúnem mulheres viajantes para encorajá-las. [ouça o áudio]

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