A principal característica daquele certame foi o sentimento de protesto contra o sistema político, fortemente influenciado pela repercussão da operação lava-jato. O resultado final, com a vitória do candidato Jair Bolsonaro, mostra como a lógica da tradicional engenharia de campanha foi contrariada. Dizem os autores: “Estávamos diante de um candidato outsider (autointitulado fora do sistema) com menos de dez segundos de tempo de televisão na propaganda oficial, sem estrutura partidária sólida que lhe garantisse palanques fortes nos estados”.
Nas seis eleições anteriores, a polarização foi entre o PSDB e o PT. O PT vinha fragilizado para o certame. Primeiro, porque era o principal alvo da operação lava-jato. Segundo, porque a presidente Dilma Roussef, embora não houvesse sido citada pessoalmente por envolvimento com a corrupção, sofreu o impeachment em 2016, mediante a acusação de que teria violado as leis orçamentárias, ou seja, praticado as assim chamadas “pedaladas fiscais”. Juridicamente, a acusação não era robusta, mas o governo mergulhou, desde o início, em uma crise política e econômica da qual não sobreviveu.
O PT contava com a popularidade do ex-presidente Lula, que liderava as pesquisas de intenção de voto, para disputar o certame de maneira competitiva, mas ele sofreu condenações em primeira e segunda instâncias, tornando-se inelegível, e foi preso na antevéspera do período oficial de campanha. Lula, porém, manteve o registro de sua candidatura, para retirá-la no prazo limite do TSE, com o objetivo de transferir votos ao seu vice, o ex-prefeito Fernando Haddad, que o substituiu como candidato principal em setembro.
Havia previsões de que chegara a hora de o PSDB voltar à presidência, apresentando a candidatura do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin. Poder-se-ia calcular que Marina da Silva, bem votada nos dois certames anteriores como terceira via, teria a preferência dos eleitores como alternativa à polarização histórica. Havia quem pudesse apostar no ex-ministro Ciro Gomes, que havia sido candidato a presidente em outras ocasiões.
O eleitor não se orientou, porém, por nenhuma dessas alternativas tradicionais. Marina da Silva terminou o primeiro turno com apenas 1%, em oitavo lugar. Geraldo Alckmin obteve 4,76%, posicionado em quarto lugar. Ciro Gomes finalizou em terceiro lugar, obtendo 12,47%. Os finalistas ao segundo turno foram Fernando Haddad, que obteve 29,28% e foi o segundo colocado, e Jair Bolsonaro, que liderou o turno com 46,03%. No segundo turno, Haddad conquistou 44,87% dos votos. Bolsonaro foi o vencedor com 55,13%.
De acordo com os autores do livro A eleição disruptiva, as razões estruturais para a vitória de Bolsonaro foram: 1) a desmoralização das elites políticas e do sistema partidário tradicional, provocada pela operação lava-jato; 2) o aprofundamento da crise da segurança pública, identificada como o maior problema nacional em algumas pesquisas; 3) o crescimento da importância das redes sociais, principalmente do whatsApp, o que potencializou mecanismos alternativos de comunicação e mobilização de apoiadores. O episódio do atentado contra a vida do candidato Jair Bolsonaro conferiu dramaticidade ao enredo, colaborando para a imagem, cultivada por seus adeptos, de que ele teria uma tarefa messiânica a desempenhar, mas esse fato potencializou uma tendência que já estava em curso.
Na linha de interpretação dos autores, com o abalo sísmico provocado no sistema político pela lava-jato, restaram dois polos dinâmicos na disputa de 2018. Por um lado, o lulismo, que assegurou, apesar da tempestade, o passaporte para o candidato do PT disputar o segundo turno. Por outro lado, o lava-jatismo. Em suma, o fator decisivo para a eleição de Bolsonaro foi ele ter sucesso na operação de ser reconhecido como o rosto desse sentimento antissistema político que regeu a eleição presidencial de 2018.