

Opinião
Sharenting e Bioética: Os Riscos da Exposição Infantil nas Redes Sociais
O comentário de Gilson Aguiar por Gilson Aguiar em 22/05/2025 - 08:00
O Que é Sharenting?
O termo Sharenting deriva da junção das palavras share (compartilhar) e parenting (paternidade/maternidade), e descreve a prática cada vez mais comum de pais compartilharem fotos, vídeos e informações sobre a vida dos filhos nas redes sociais. Essa exposição pode começar desde o nascimento — ou até antes — e se estender por toda a infância. Para algumas mães e pais, esse hábito vai além do simples registro familiar: trata-se de uma forma de monetização, gerando engajamento, parcerias comerciais e até renda.
Exposição como “série” da vida real
Durante um evento recente sobre Sharenting e bioética, essa prática foi discutida com profundidade. A pesquisadora Sofia Ivantes, orientada pelos professores Lucas Garcia (coordenador da pesquisa) e Leonardo Oliveira, apresentou dados e análises que revelam um panorama preocupante: muitos pais transformam a vida cotidiana com os filhos em uma espécie de “série” nas redes sociais, com episódios, temporadas e narrativas contínuas. O que parece ser uma simples forma de compartilhar momentos em família pode, na verdade, implicar consequências graves para as crianças.
Os filhos, ao serem constantemente exibidos, correm o risco de terem sua identidade moldada pelos desejos e interesses dos pais. Tornam-se personagens, criados e moldados para o consumo digital, antes mesmo de compreenderem o que isso significa.
Consequências para a identidade e a privacidade
Segundo os pesquisadores, estamos caminhando para um cenário onde muitas dessas crianças terão dificuldade em separar quem realmente são do personagem que foi construído sobre elas. No futuro, ao tentarem reivindicar sua individualidade, poderão encontrar barreiras impostas pela exposição pública de sua infância — uma exposição sobre a qual não tiveram qualquer controle ou consentimento.
A pesquisa aponta um dado alarmante: em países como Austrália, Estados Unidos, França e Espanha, mais de 80% das crianças com menos de dois anos já possuem uma pegada digital. Ou seja, já estão presentes na internet de alguma forma, mesmo sem qualquer capacidade de decidir sobre isso.
Quando a exposição se torna agressão
Há casos, inclusive, de filhos que, ao atingirem a maioridade, processaram seus próprios pais por sentirem-se violados e agredidos pela forma como foram expostos. As redes sociais transmitem a ilusão de um ambiente íntimo e controlado — como se postar uma foto fosse como guardá-la em um álbum de família. No entanto, o que se compartilha online se torna público, passível de ser copiado, comentado e acessado por qualquer pessoa, inclusive com intenções nocivas.
Essa exposição transforma o cotidiano infantil em um diário aberto, onde a privacidade é substituída pela visibilidade. E essa visibilidade pode vir acompanhada de julgamentos, invasões de privacidade e até violência digital.
Um alerta necessário
A internet, embora ferramenta poderosa, está se tornando para muitos uma espécie de princípio organizador da vida — inclusive da vida familiar. É necessário, portanto, refletir com seriedade sobre os limites éticos da exposição dos filhos nas redes sociais. O Sharenting não é apenas uma questão de estilo de vida ou escolha pessoal. Trata-se de uma responsabilidade profunda, que envolve o direito à privacidade, à identidade e à dignidade das crianças.
É urgente que pais, educadores e a sociedade em geral desenvolvam consciência crítica sobre o impacto da exposição digital precoce. Antes de compartilhar, é preciso pensar: estamos respeitando a autonomia e o futuro dos nossos filhos? Ou estamos apenas moldando-os para caber em um enredo que não escolheram viver?
Até a próxima!
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